terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

O DIA DO SEU ENTERRO

Não é uma boa ficar falando de morte, velório, enterro, cemitério ou coisas parecidas tipo: qual o tamanho do seu caixão?
Você tem terreno ou jazigo de família em algum local pra fazer a sua cova, seu túmulo?
Quem vai levar seu ataúde? Vai ter quorum no seu velório, principalmente durante a madrugada? Você tem algum plano funerário ou está guardando algum pra's despesas mortuárias?
São perguntas cabulosas (como diria o César Cooperfield), porém que devem ser analisadas a fundo, friamente, pois afinal uma coisa é certa todo mundo um dia morre!
O seu enterro aconteceu de uma maneira normal, seu terno estava sem ir a um tintureiro desde a última festa naquele dia ensolarado, mas tudo bem, dentro da urna com aquelas flores mórbidas ao redor não deu pra ninguém notar, nem mesmo aquela reparadeira da sua rua que sabe mais da sua vida que você mesmo, quem sabe poderia escrever suas memórias?
O caixão era de boa qualidade e confortável, apesar de você ter adquirido parajú e mandarem um de pinus, com acabamento trabalhado, todo preto, enfim um belo paletó de madeira, como diriam alguns apreciadores de bebidas alcóolicas do botequim que você freqüentava até muito.
Muitas pessoas queridas estavam ao seu redor pensando em tudo, se você tinha seguro e qual o valor, se pegou algum emprestado e não pagou, quem iria cuidar da viúva, e o cartão da mega ficou com quem? Outros choravam e uns meditavam: “Já vai tarde essa anta”.
Uma boa idéia foi aquela de deixar por escrito suas últimas vontades, seus últimos desejos, tais como: levar um talão de cheques pra alguma despesa de translado ou café da manhã; um xerox de alguns documentos de identidade, certidão de nascimento, CPF e carteira de trabalho, a burocracia do além pode ser eternamente perversa...
O carro fúnebre de som anunciando seu falecimento ao som de uma boa suite de rock progressivo, talvez Time do Pink Floyd ou aquela do Camel, o problema é o cara do som arranhar seu CD.
Já que, depois de morto, muita coisa pode rolar, quem sabe um pedido seu, um argumento de defunto, uma solicitação “pós mortis”, não seja prontamente atendida?
Quem sabe a Caixa Econômica Federal realmente facilite a vida dos candidatos a mutuário ou mortuário?
E se o DNIT num ataque de competência e numa recaída de honestidade aplicasse todos os recursos recebidos do governo nas estradas, principalmente na BR-267?
Outra solicitação do moribundo poderia ser concretizada: que as obras do metrô fossem realmente iniciadas; e que as árvores da alameda do cemitério fossem preservadas da ira da moto-serra, afinal uma sombra no seu leito eterno cairia bem, já que protetor solar é coisa de outras praias.
Você vai feliz, muitas coisas que em vida nunca conseguiu realizar irão certamente se concretizar, exemplo: você agora é dono do seu nariz, vai poder dormir fora (ou dentro da catacumba); se ficar sem tomar banho ninguém vai reclamar; sua falta de diálogo não será mais causa de discussão.
Algumas coisas também vão mudar: Primeiro: seu endereço, apesar de sua correspondência continuar indo pro antigo local e ser violada. Segundo: seu peso que tanto lhe preocupava, dietas, carboidratos, você irá perder o excesso e o restante tambem mesmo sem querer. Terceiro: a renovação da sua carteira de motorista não precisará de psicotécnico nem de mais nada e Quarto: é que seu chefe vai ter que dar ordens pra outra pessoa.
O féretro, ou cadáver, ou ainda o esquife, ou melhor, o presunto, agora jaz inerte na posição horizontal, e finalmente será colocado no interior do túmulo. Aí então é que o bicho começa a pegar, literalmente, pois são seus novos amigos e mordedores, não aqueles que sempre te deram o cano, nem os mais chegados que disputavam palmo a palmo seus ganhos materiais, mas formigas, minhocas, vermes, baratas e outros habitantes das profundezas.
Não adianta chorar, você agora está debaixo de sete palmos de terra, no escuro, sozinho com seu talão sem fundos (pois nestas alturas já estarão detonando suas economias), qual o caminho a seguir? Virá alguém te encaminhar ou te guiar? Um anjo bom ou uma carruagem sinistra? Como será a vida eterna?
E aquele cara que queria te ver nos quintos do inferno, será que a praga colou? Ou entre altos e baixos você esteve na média?
É, cumpadi, como diria São Tomé: "é ver pra crer..."


Amilcar é mortal.

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sacadinha do pum