domingo, 31 de janeiro de 2010

NEURA DE CHECK-UP

Faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço! É uma frase manjada, porém muito correta. Corretíssima!
Depois que a medicina ficou mais evoluída, mais precisa, diagnósticos mais bem fundamentados, tratamentos específicos, remédios poderosos e exames quase infalíveis, começou meu sofrimento.
Era pra ser justamente o contrário, o inverso, mas não. Acho que fiquei mais vulnerável, mais visível, meu sangue virou um livro aberto, não um livro de bolso qualquer, também nenhuma obra-prima, talvez um Alighieri ou um Bocaccio.
O fato é que os papos giram, fala-se de mulher, da vida alheia, de rock progressivo, viagens e comidas, trabalho, família e sempre a conversa volta pro problema dos carboidratos, das toxinas e da saúde em geral.
Um exame detalhado do seu estado físico geralmente causa ansiedade e desconforto. Eu, particularmente, sou bastante relapso quanto aos exames e quase não os faço. Talvez devesse fazer mais, porém, vou deixando pra depois, tipo: ano que vem vou fazer um check-up, uma geral, eletrocárdio, encéfalo, abreugrafia, próstata, sangue, urina, fezes, etc.
Fico inclusive pensando na roupa que usaria nessas ocasiões. Pro eletro: tênis, bermuda e camiseta; próstata: vou de samba-canção e de fezes: paletó e gravata, como diriam os céticos.
Até aí, tudo bem. O problema é quando o médico começa a análise da sua carcaça, visto que seu espírito, bem, é melhor contar pra um analista, daqueles que te botam deitado num divã e recebem pra escutar todas as suas lorotas e traumas de infância.
“Analisando friamente sua freqüência cardíaca podemos constatar que pela sua idade você está com uma deficiência de 3% em relação à média recomendada e que suas fezes, além de mal cheirosas, estão com altas taxas de graxas, provolones, lúpulos, maltes e proteína animal”.
Pronto, tá feito o estrago. Como é que eu vou falar pra mim mesmo que tenho que reduzir o tira-gosto, que estou com vestígio de sangue nas veias alcoólicas e, que não adianta pagar o menino (depois que ele voltar) pra ir dar voltinhas no Campus a pé pra mim, isso não é Cooper!
Essa neura é que transforma o caboclo em hipocondríaco, em maníaco por malhação, caminhadas, controle de peso, alimentos sem calorias, vitaminas, moderadores e anabolizantes.
Pela manhã um desjejum frugal: frutas, iogurte, mel e queijo minas frescal, depois meia hora de esteira a 7.5 Km/h e uma ducha fria. No almoço um bife grelhado com salada sem legumes que nascem debaixo da terra e, à noite, etc., etc.
Tudo bem, é pro seu bem, você vai se sentir melhor, seu desempenho, em todos os aspectos, irá melhorar profundamente, inclusive no quesito em que você se acha o melhor, o mais bem dotado, o infalível, o total, ou seja: na cama, roncando... Dizem inclusive que quem ronca dorme primeiro...
Agora, tem uns caras que ficam apavorados, medem as taxas do sangue como se estivessem olhando as horas, comem berinjela em altas doses, não acreditam nos resultados, mudam de laboratório, descobrem novos exames... Tem um desses neuras que quer que seu sangue seja encaminhado à NASA e seja analisado nos laboratórios da plataforma espacial, sem a força da gravidade, na estratosfera.
Outros já acham que as amostras do sangue devem ser retiradas diretamente do miocárdio, ou do próprio coração, pois esse sim é um CB, “çangue bão”. Essa amostra extraída no braço vem impregnada de impurezas que encontra pelas artérias e veias.
Já para os GLS’s, o exame de toque retal deveria ser diário, ou melhor, horário, para não se ter dúvida de nada, ou melhor, de tudinho...
Os religiosos acham que o sangue deveria ser bento antes de qualquer análise, e o resultado informado pelo pastor ou pelo bispo, ou pela pastoral do hemocentro.
A neura chegou a tal ponto que tem gente fotografando o que come e comparando com o que sai para tentar encontrar o vilão. Parece filme policial ou de guerra? Você, ali, bem no meio do pelotão!???
Às vezes, os exames dão resultados normais, as taxas todas equilibradas, só que a neura é maior e o cidadão descobre que a soma do colesterol bom com o colesterol ruim tem que ser um número primo, ou seja, o cara começa a xingar os parentes, fala em hereditariedade, fala até em contratar um engenheiro florestal para refazer sua árvore genealógica...
Nisso eu vou ganhando tempo, vou deixando pra amanhã... Quem sabe lá estes exames todos poderão ser analisados através da impressão digital, ou da íris, ou ainda das unhas, quem sabe dos fios de cabelos?
Enquanto esses exames não são inventados ou aprimorados, vou curtindo a minha neurose, vou levando dessa forma, tentando entrar em forma (de barril), com a mente quieta e a espinha ereta, se possível sem muita pressa.

Amilcar é A+


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